A
poesia tem ficado um pouco ausente de nossas vidas. Quando era menino, na
escola ler poesia era obrigação, quem não leu “ As pombas” de Raimundo Correia
e não ficou embatucado com a “raia sanguínea e fresca a madrugada”? E o Navio
Negreiro de Castro Alves? Tinha um colega que conseguia declamar tudo, ainda
lembro o final com um dramático “Colombo! Fecha a porta de teus mares”, já dito
com a voz embargada.
Essa
lembranças me ocorreram em um dia em frente a TV assisti, (naquele breve
intervalo de tempo que minha compulsão
de mudar de canal me deixa ver alguma coisa) duas coisas interessantes. Na
primeira uma entrevista com Patti Smith, uma poeta do rock que agora lançou sua
biografia: Só Garotos, (Companhia
das Letras). Ainda não li, mas a entrevista e as resenhas me obrigam a fazê-lo
imediatamente. Na segunda, em um dos intervalos da entrevista aparece uma
propaganda da Net TV onde um cara toca um violão e canta no estilo Lou Reed.
Bom,
Patti Smith é uma espécie de transição do beat para o punk. Levou a poesia para o cenário do rock: “desire is hunger is the fire I breathe. Love
is a banquet on wich we feed...”. Tô doido... Estes versos
são trecho da letra da clássica “Because
the Night”, composta com Bruce
Springsteen. Existem
diversas versões na internet, mas essa de
1979, ainda com o Patti Smith Group, me pareceu a melhor. Dêem uma olhada: http://www.youtube.com/watch?v=0brHGJ6xqbk&feature=related.
Na
entrevista Patti conta sobre a influência que teve dos poetas Allen Gisnberg e Willian
Blake. O primeiro era americano, teve participação intensa no cenário dos anos
60 e na formação da cena hippie, foi amigo de Jack Kerouac , devotado seguidor
de sexo, drogas e poesia, não necessariamente nesta ordem... O lance com as drogas o fez aproximar-se de Timothy
Leary criador do movimento LSD (League
of Spiritual Discovery) que defendia o uso do ácido lisérgico (que acabou tendo
como sigla o nome do movimento...) como “ferramenta” de libertação da mente,
enfim... doideira pouca é bobagem. Já Willian Blake era inglês e viveu entre os
séculos XVIII e XIX. Era poeta e pintor . Suas obras carregadas de sentidos
obscuros e místicos inspiraram por muitos anos os esotéricos e eram figurinhas
carimbadas na Revista Planeta. Aí temos uma mistura legal que é a cara dos anos
60: liberdade, sexo, drogas (muitas drogas...) poesia, música, esoterismo,
misticismo. No livro, o painel deste anos 60/70 são o pano de fundo para a
formação de Patti, narrada através de sua história e vida com o fotógrafo
Robert Mapplethorpe.
Bom,
Patti Smith vive e viveu a maior parte de sua vida em New York, cenário por
onde trança e também vive Lou Reed. Ele levou temas mais adultos para o rock
dos anos 60 que ainda estava na sua adolescência, também levou mais cultura e
uma postura, digamos assim, alternativa. Suas músicas são para ambientes
pequenos, com barulho de copos, conversas e muita fumaça de cigarro. Ouça a barra
pesada “Walk on the wild side”, no link: http://www.youtube.com/watch?v=qkwD261MHsc&feature=related., atenção para as “colored girls”…
Não
é só New York que une os dois, mas sim uma atitude rock’nroll, visões ácidas e
ao mesmo tempo românticas de uma realidade crua. Vejam este trecho do filme
“Faraway, so close” de Wim Wenders, onde o anjo Cassiel depois de virar humano
em Berlim, vai a um show de Lou Reed, que toca “Why can’t I be good”. Está em : http://www.youtube.com/watch?v=2S3U_lHWR9M.
Vale a nota que o filme é de 1993, pós queda do Muro, tem uma trilha sonora interessante e a bela
presença de Natassia Kinski como a “anja” Raphaela. Em 1998 houve uma versão
americana deste filme, chamada “City of Angels” que fica muito longe do
original, tudo bem que o filme tem na
sua trilha sonora “Uninvited” da Alanis Morissette, com aquele arranjo de
orquestra e tudo mais, e o fantástico blues “Red House” de Jimi Hendrix, mas
não vale a pena assistir só por isso.
Fico
tentando achar a conexão que me fez, vendo Patti Smith, lembrar Raimundo
Correia e Castro Alves. Não saberia dizer, o poeta das pombas flertou com o
simbolismo, não sei... já o poeta dos escravos era da escola romântica...sei
lá... Acho que não ajudou nada, vou mudar de canal!
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